Jaime Silva e os gestos do corpo


Sem título 1980, Carvão/pastel/tinta da china s/ papel, 150 x 182 cm

Finalmente uma revisão antológica da carreira do pintor Jaime Silva na SNBA. Miguel Matos foi ver e recomenda.

Jaime Silva é um artista que, sem ter o seu nome permanentemente badalado nos meandros da arte contemporânea, continua a trabalhar durante décadas, experimentando técnicas e linguagens diferentes. Uma longa carreira como esta necessita de uma revisão periódica da matéria dada. É isso que podemos observar na Sociedade Nacional de Belas-Artes (SNBA) com esta exposição antológica: um pouco da história da vida do artista, desde as suas primeiras incursões na arte até à actualidade, em pintura e desenho.

Jaime Silva nasceu em Peso da Régua, em 1947. Licenciou-se na Escola Superior de Belas-Artes do Porto e pouco tempo depois formou o Grupo Puzzle, juntamente com Graça Morais (com quem foi casado durante 18 anos), Albuquerque Mendes, Armando Azevedo, Carlos Carreiro, Dario Alves, João Dixo, Pedro Rocha e Pinto Coelho. Paralelamente, ao longo da sua carreira de pintor, tem leccionado em escolas como o Ar.Co e a Sociedade nacional de Belas-Artes. Nunca se dedicou em exclusivo à pintura e escolheu partilhar os seus conhecimentos, fazendo uso das suas qualidades de comunicação, coisa rara nos artistas portugueses.

A antologia que a SNBA dedica a Jaime Silva começa logo nas suas primeiras experiências plásticas académicas. Enquanto aluno desenvolveu trabalhos de cariz diverso que se expõem nestas salas, para que se perceba que este homem tem interesses diversificados, mas sempre com alguns eixos que se mantêm, como são a exploração da presença do corpo, a relação física do pintor com a tela, o espaço e as linhas do desenho. Aliás, o desenho neste artista tem um carácter enérgico, rápido, de espontaneidade a toda a prova, como se pode ver em obras de grande dimensão de início de carreira e mais tarde em enormes telas de expressionismo gestual cheias de cor, dinâmica e força. Algumas obras são de enorme impacto e vibração, com efeitos imediatos em quem as olha. Depois, para que se entenda a obra deste autor, há um pouco de cada fase: desde o experimentalismo aplicado ao desenho de nu, ao informalismo e expressionismo, a um lado de desenho automático e quase psicanalítico.

As suas experiências mais actuais consistem numa selecção de obras de uma exposição recente no Palácio Nacional da Ajuda, em que Jaime Silva pinta formas labirínticas, como metáforas para as relações sinuosas do poder instituído. Para além destas, há sempre uma relação visceral com a pintura. O corpo aparece representado com a sua dimensão carnal bem vincada, o que parece destoar com a espiritualidade e quase minimalismo das suas paisagens inventadas. Todas estas referências tocam em pontos aparentemente opostos, mas para quem expõe há 38 anos, estranho seria se se tivesse mantido sempre no mesmo registo.

Exposição Antológica. Na Sociedade Nacional de Belas-Artes (Rua Barata Salgueiro, 36) até 27 de Abril. Seg-Sex 12.00-19.00. Entrada gratuita.

in Time Out, 27 de Março a 2 de Abril 2013
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